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Cabeça de animal no campo não pode ser novo normal — bem como combater homofobia com misoginia

Cabeça de animal no campo não pode ser novo normal — bem como combater homofobia com misoginia

Não deveria ser possível que arremessar cabeças de animais nos gramados de futebol tenha se transformado no “novo normal”. Mas aconteceu.

O ano é 2024. E um membro da maior torcida do Estado de São Paulo, com a conivência e ou inépcia de quem deveria impedir tais atos, achou não apenas que deveria entrar na Neo Química Arena com uma cabeça de porco, mas também jogá-la no campo, em novembro.

Sem poder ofender os torcedores do Palmeiras com a alcunha de “porcos”, devido à astuta e bem-humorada adoção do apelido há mais de 40 anos, corintianos concluíram que o pouco sutil gesto de decapitar o animal “palmeirense” e arremessar sua cabeça no gramado tinha o tom adequado.

Em outros termos, ali estava expresso o desejo daquele torcedor: decapitar um palmeirense e jogar sua cabeça em uma arena. Aliás, “Arena”, termo que faz alusão aos novos estádios padrão Fifa, vem bem a calhar ao se tratar do caso. Sua origem etimológica remonta, afinal, aos circos romanos onde decapitações e outras barbáries eram a lei.

Em fevereiro deste ano, sem que a autoria do gesto tenha sido requisitada, uma nova cabeça de porco foi deixada nas imediações do Allianz Parque pelo mesmo torcedor do primeiro caso. Naquele dia, os rivais jogaram e empataram por 1 a 1 pela fase de grupos do Campeonato Paulista de 2025.

Nova cabeça de porco aparece em frente ao Allianz Parque antes de Palmeiras x Corinthians – Foto: Allex Muller/Reprodução X

Barbárie alvinegra respondida com barbárie alviverde

Foram dois meses de espera. Mas, ao final de Palmeiras 2 x 0 Corinthians do último sábado (12), foi a vez dos palmeirenses arremessarem no campo duas cabeças de galinha, em alusão a um apelido pejorativo dado aos corintianos.

Curiosamente, “galinhada” é um termo muito mais usado por são-paulinos do que por palmeirenses. Historicamente, os alviverdes sempre preferiram ofender os corintianos com o xingamento “gambá”, que remonta ao começo do século XX.

É difícil até escolher por onde começar a falar sobre o assunto. Como é possível não apenas alguém entrar em um estádio com a cabeça de um animal, mas também arremessá-la em um campo de jogo?

Pelos atos, o corintiano Osni Fernando Luiz, o ‘Cicatriz’, está impedido de entrar em jogos e teve seu perfil no Instagram excluído. Algo que, no mínimo, deverá ser aplicado aos palmeirenses identificados como participantes do ato com as cabeças de galinha.

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Patriotada e clubismo de Romero são descabidos

Joaquín Piquerez disputa bola com Romero, do Corinthians (Foto: Cesar Greco/Palmeiras/by Canon)

Tão absurdo e fora de propósito para 2025 quanto as cabeças de porco é o canto de “Romero Viado”, proferido por palmeirenses antes de a bola rolar em Barueri.

Xingamentos centrados em tratar sexualidade como questão pejorativa, à luz dos dias atuais, deveriam ser vistos como algo tão bárbaro quanto as cabeças de animais arremessadas nos gramados.

Mas, no país ocidental onde mais ocorrem homicídios contra pessoas lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e travestis, não é de se estranhar que isso continue sendo encarado como algo normal e impassível de revolta.

E o que também não pode é uma resposta como a de Romero. Num arroubo patriótico e clubista — tanto pelo Cerro Porteño, que o revelou, quanto pelo Corinthians –, indagado sobre o tema, o paraguaio decidiu que a pessoa que deveria ser cobrada era uma mulher, a presidente do Palmeiras Leila Pereira:

— Essa pergunta deveria ser para a presidente do Palmeiras, se ela está preocupada com isso. Está à vista tudo que aconteceu hoje. Não vai acontecer nada, porque a gente sabe da torcida de quem vem, mas se fosse na (Neo Química) Arena, a gente sabe o que iria acontecer — disse ele.

— Vou continuar combatendo isso, mas quero ver se terá punição. Aconteceu a mesma coisa no jogo contra o Cerro Porteño, a mesma torcida, ato de racismo. Vamos ver se a Conmebol faz alguma coisa. Vamos ver se eles punem realmente o que está errado, ou se alguns têm preferência — completou.

Um erro não justifica outro

Luighi, atacante do Palmeiras, chora após ser vítima de racismo (Foto: Reprodução)

O discurso de Romero está calcado em um óbvio revanchismo pela campanha do Palmeiras a partir do ato racista da torcida do Cerrro Porteño, no episódio envolvendo Luighi. Pelo qual, o clube que revelou Romero foi multado em ridículos US$ 50 mil dólares.

É curioso o tamanho da desinformação de Romero. Diante do tal vídeo de racismo cometido por um palmeirense no jogo contra o Cerro, o Palmeiras rapidamente identificou e puniu o torcedor em questão, o expulsou do Avanti e da plataforma de compra de ingressos dos jogos do clube como mandante. Tudo não só com a anuência, bem como sob o comando de Leila Pereira.

Criticar a presidente do Palmeiras por ter sido chamado de “viado” é não apenas oportunismo e revanchismo, mas também é alimentar a misoginia que a dirigente e todas as mulheres envolvidas no mundo do futebol sofrem diariamente.

E o futebol segue no ciclo vicioso sem fim de erros justificando mais erros.

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