No Plenário, o projeto foi aprovado em votação simbólica e segue para apreciação da Câmara dos Deputados
O Senado aprovou, na noite de quarta-feira (28), o Projeto de Lei (PL) 2985/2023, que impõe regras mais rígidas para a publicidade de apostas esportivas eletrônicas, conhecidas como bets.
O texto, relatado pelo senador Carlos Portinho (PL), proíbe, entre outros pontos, o uso da imagem de atletas, influenciadores, artistas e autoridades em campanhas de marketing, além de restringir os horários de veiculação das propagandas.
A proposta, de autoria do senador Styvenson Valentim (Podemos), foi aprovada na forma de um substitutivo, apresentado por Portinho, na Comissão de Esportes (Cesp). Embora a votação terminativa estivesse prevista para ocorrer na Comissão de Comunicação e Direito Digital (CCDD), a ausência de instalação do colegiado levou os senadores a defenderem o envio direto ao Plenário.
A presidente da Comissão de Esportes, senadora Leila Barros (PDT), apoiou a sugestão e se comprometeu a interceder junto ao presidente da Casa, Davi Alcolumbre (União), para que a matéria avance. No mesmo dia, a matéria foi pautada no Plenário.
“Desde o primeiro momento em que a gente pautou o projeto na Comissão de Esportes, houve uma convergência entre todos os campos que estão dentro da Comissão. Foi um projeto que prezou muito pelo bom senso” , declarou a senadora Leila Barros.
“O relator, senador Portinho, não foi para o lado mais radical, de proibir totalmente a questão da publicidade, mas escutou todos os atores, todos os envolvidos, todos os interessados e conseguiu chegar a um relatório que eu, particularmente, como Presidente e como membro da Comissão de Esporte, acho que é o melhor para o momento” , acrescentou.
O texto original previa a proibição integral da propaganda de apostas esportivas em qualquer meio. No entanto, o substitutivo adotado por Portinho opta por regulamentar a atividade, impondo uma série de restrições. No Plenário, o projeto foi aprovado em votação simbólica e segue para apreciação da Câmara dos Deputados.
“Raras vezes eu vi, nesta tribuna, um projeto de lei que teve o apoio suprapartidário. Poucas vezes, neste Senado, eu vi uma unidade em torno de um projeto, desde a Comissão até o Plenário. Parabéns ao Senado Federal por uma resposta rápida à população” , comemorou o relator, senador Portinho, após a aprovação do projeto. O parlamentar ainda pediu ao presidente do Senado que ajude no diálogo com a Câmara para que o texto avance.
Sociedade doente
Ao justificar o relatório, Portinho argumentou que o setor de apostas esportivas, mesmo após um ano de regulamentação com a Lei 14.790/2023, não se autorregulamentou de forma eficaz.
Ele criticou a superficialidade dos alertas atualmente utilizados — como o slogan “jogue com responsabilidade” — e afirmou que a sociedade brasileira enfrenta uma verdadeira epidemia de ludopatia, impulsionada pela explosão das apostas online.
“Os clubes de futebol se viciaram nas bets. As empresas de comunicação se viciaram nas bets, nos anúncios, no dinheiro que recebem das bets. E com essa pandemia, nos cabe aqui disciplinar” , afirmou o relator.
Apesar de preferir a proibição total da publicidade, Portinho disse ter cedido em prol de um texto mais equilibrado, que busque consenso sem criar insegurança jurídica para um setor já autorizado por lei. Nesse sentido, o substitutivo estabelece uma série de vedações à propaganda das apostas de quota fixa.
Entre as restrições estão a proibição de propagandas durante a transmissão ao vivo de eventos esportivos; a vedação ao uso de odds dinâmicas ou cotações em tempo real durante os jogos; o impedimento de divulgação em mídias impressas e no impulsionamento de conteúdos fora do horário permitido; e a proibição do uso da imagem de atletas, artistas, comunicadores, influenciadores e autoridades — inclusive como figurantes.
O projeto estabelece que apenas ex-atletas aposentados há mais de cinco anos poderão participar das publicidades. Além disso, a matéria estabelece restrições ao patrocínio a árbitros e membros da arbitragem; a proibição de peças que apresentem apostas como solução financeira, investimento ou forma de promoção pessoal; e o bloqueio de conteúdos dirigidos ao público infantojuvenil, inclusive com uso de personagens animados ou recursos audiovisuais.
A proposta ainda prevê a vedação a comunicações sem consentimento prévio, como notificações e mensagens por aplicativos; a proibição de publicidade sexista, discriminatória ou que associe apostas a estereótipos de gênero; e a proibição de publicidade estática ou eletrônica em estádios e praças esportivas, com exceção para naming rights e patrocinadores de uniformes — limitado a um anunciante por equipe.
O que será permitido
Apesar das restrições, o projeto permite a veiculação de publicidade em horários e canais determinados. A propaganda poderá ser exibida, por exemplo, na TV aberta, por assinatura e streaming e nas redes sociais, das 19h30 às 24h.
O projeto ainda possibilita as propagandas no rádio, das 9h às 11h e das 17h às 19h30; durante transmissões esportivas ao vivo, nos 15 minutos anteriores ao início e nos 15 minutos posteriores ao fim do evento; em sites e aplicativos controlados por operadores licenciados, acessíveis voluntariamente pelos usuários; e nas chamadas de transmissões esportivas veiculadas entre 21h e 6h, desde que não contenham incentivo direto às apostas.
Nas redes sociais e plataformas digitais, a publicidade será permitida apenas para usuários autenticados e maiores de 18 anos.
O autor do projeto, Styvenson Valentim, elogiou o esforço de Portinho em buscar equilíbrio, embora tenha reiterado que preferia a versão original, mais rígida. Segundo ele, o texto final é um “alerta” para o mercado e uma chance para que clubes e empresas demonstrem compromisso com a saúde pública. “Se o mercado não se adaptar, o Congresso terá de dar respostas mais firmes”, advertiu.
Durante a discussão, Portinho leu uma carta enviada por clubes de futebol manifestando preocupação com os impactos econômicos da proposta. Entretanto, segundo ele, parte da população tem se posicionado a favor das restrições, inclusive pedindo a remoção de patrocínios nas camisas dos times e nas placas de estádios.
“Os torcedores têm apontado os clubes como cúmplices de uma epidemia que vem destruindo famílias” , relatou o senador.
CPI das Bets
A senadora Soraya Thronicke (Podemos), relatora da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga a crescente influência dos jogos virtuais de apostas online e a possível associação com organizações criminosas envolvidas em práticas de lavagem de dinheiro, comemorou a aprovação do projeto de lei.
A parlamentar ressaltou que o projeto busca combater a lavagem de dinheiro, a evasão de divisas e os impactos sociais das apostas. Ela elogiou a condução do presidente do Senado, Davi Alcolumbre, na análise da proposta e pediu que a Câmara também avance no tema.
“O presidente teve uma coragem louvável; sofreu pressão, mas se manteve firme. Aprovamos o regime de urgência e ontem conseguimos limitar a propaganda ao máximo, e tomara que consigamos um dia limitar totalmente” , disse.
“Só o fato de não permitirmos mais pessoas divulgando as bets já foi um grande avanço. Eu espero que a Câmara tenha a mesma altivez desta Casa, que a Câmara tenha a mesma coragem de enfrentar um gigante que, infelizmente, tem por trás a atuação do crime organizado” , complementou a senadora.